Um jogo de terror independente lançado em 2014 que ganhou continuações, livros, inúmeros teorias e fóruns de discussão dos fãs e mais recentemente, uma adaptação cinematográfica. Five Night at Freddys é a prova do quão longe uma fanbase apaixonada e engajada pode te levar. 

Sumário:

1. Primeiro, a terminologia: o que é lore?
2. O que tornou FNaF popular? 
3. O terror bem feito e o Uncanny Valley 
4. O filme 

1. Primeiro, a terminologia: o que é lore?

A definição que você encontra no Urban Dictionary (uma ótima fonte de expressões e gírias em inglês) descreve a palavra lore como “a história coletiva e a soma de todos os conhecimentos disponíveis sobre um determinado universo de fantasia ou ficção científica”. É um conceito próximo à palavra “narrativa” em bom português, mas é comum ver esse termo ser muito utilizado quando se fala de jogos, filmes e livros.

Tendo isso como ponto de partida, a lore de Five Nights at Freddys é complexa, especialmente considerando que existem quatro edições do jogo, cada uma com uma história distinta. 

A premissa do jogo gira em torno de dois amigos que decidem empreender juntos, inaugurando a Freddy’s Pizzeria, uma pizzaria projetada para encantar crianças, parecido com o modelo de grandes redes americanas como o Chuck E. Cheese.

Inicialmente, o local era um paraíso para as crianças, repleto de comidas deliciosas, atividades recreativas, música e as estrelas do estabelecimento, os animatrônicos: Freddy, um urso; Chica, uma galinha trajando um avental com a frase “let’s eat” (vamos comer); Foxy, uma raposa; e Bonnie, uma coelha. 

A aparente perfeição desmorona quando ocorre a primeira morte na narrativa, desencadeando uma reviravolta surpreendente: o espírito da criança assassinada torna-se aprisionado dentro de um dos animatrônicos. 

Essa ideia de espíritos vinculados aos personagens e que concedem vida a eles constitui a essência de tudo que se desenrola em FNaF. E isso aqui é só o começo. Se você se interessou, pode ter certeza que o buraco de teorias e interpretações sobre a trama, os personagens é bem fundo. Aqui, vamo dar uma pincelada, só pra você se situar no contexto e quem sabe, instigar sua curiosidade. 

Ah, e antes da gente continuar, a partir de agora o nome Five Nights At Freddys vai ser citado apenas pela sigla, FNaF ok? 

2. O que tornou FNaF popular? 

A primeira edição do jogo foi lançada em 2014 e o sucesso popular foi o que fez ele sair de uma categoria de jogos indie, pequenos e o lançou ao estrelato. 

Um dos motivos para essa ascensão rápida de FNaF foi o interesse de youtubers famosos que faziam gameplays em seus canais no Youtube.

Gameplay é em essência a experiência interativa de jogar um videogame. isso implica na maneiro que o jogo é jogado em sim, as regras, as dificuldades, os sistemas de controle. mas o termo gameplay também inclui a narrativa do jogo, o design e a estética que possui e as tomadas de decisão que o jogador toma e quais as consequências disso no jogo. 

Essas gameplays ajudaram a espalhar a palavra de FNaF e além disso, por ser um jogo de terror, essas gameplays ganhavam visualizações por gerar um entretenimento em partes cômico, mostrando jogadores levando sustos. Além de que era uma maneira com que as pessoas que não queriam jogar o jogo, por medo, receio ou que não queriam a experiencia de terror, vivenciarem de certa forma o jogo, apenas como observadoras. 

O jogo conquistou o Youtube e deu origem a uma série cheia de continuações, prelúdios, minijogos e até livros adicionais, além de criar uma comunidade animada de teorias sobre a mitologia, fanfics e muitas outras formas de expressão criativa. 

3. O terror bem feito e o Uncanny Valley 

Você começa a jogar FNaF, o cenário é o seguinte: você é um(a) segurança encarregado da vigilância noturna da pizzaria Freddy Fazbear’s, operando a partir de um escritório equipado com câmeras que abrangem todo o estabelecimento, além de contar com duas saídas. Embora o cenário inicial possa parecer simples, há um contraste vivido com a trama complexa do jogo.

Ao se aventurar na pesquisa sobre FNaF, explorando fóruns e buscando compreender a narrativa subjacente e os eventos que ocorrem durante o jogo, torna-se evidente que a história é incrivelmente intrincada. 

O jogo, no entanto, mantém uma atmosfera enigmática e quase claustrofóbica, sugerindo o pensamento – e a sensação – de que algo terrível ocorreu na da pizzaria, mas sem te explicar em palavras claras o que se deu naquele ambiente. 

No primeiro jogo, lançado em 2014, a peculiaridade é intensificada pelo fato de que não é possível estabelecer diálogo com os animatrônicos, questioná-los ou buscar respostas sobre os eventos passados. A única estratégia que você tem no jogo é se esconder. 

Esse aspecto, sem dúvida, contribuiu significativamente para a popularização de FNaF: a habilidade única de construir o terror nos jogos. A sensação de estar indefeso, enfrentando o desconhecido e tentando sobreviver à noite, confere ao jogo uma experiência de horror única e envolvente.

Um dos elementos que acrescenta uma camada de terror em FNaF é o fenômeno conhecido como “Uncanny Valley” ou, em português, o “Vale da Estranheza”. Inicialmente associado aos campos da robótica e estética, esse conceito se baseia em e oferece reflexões sobre a relação entre humano e máquina.

A expressão foi cunhada pelo engenheiro e professor japonês de robótica, Masahiro Mori, em sua obra “Bukimi No Tani Genshō” – traduzido literalmente como “Fenômeno do Vale Misterioso”. 

A observação central do livro destaca uma linha tênue entre a aparência humana e a semelhança com um robô. A ideia fundamental é que experimentamos emoções positivas ao nos depararmos com semelhanças conosco, mas só até certo ponto. 

Quando a semelhança se torna muito próxima e a distinção entre humano e não humano se torna muito mais embaçada, essas emoções tendem a se tornar negativas. Algumas teorias psicológicas, como a teoria da percepção imitativa, buscam explicar esse fenômeno.

Embora o ponto de referência para discutir o “Uncanny Valley” seja a figura humana, há uma graduação que se estende para outros seres que se assemelham, em diferentes graus, à forma humana, como é o caso dos animatrônicos.

O universo de FNaF utiliza habilmente esse conceito ao apresentar animatrônicos que, embora se aproximem da aparência humana,  ainda mantêm uma estranheza que contribui para a atmosfera de terror no jogo. 

Os personagens de FNaF são animatrônicos bípedes que se movem de maneira peculiar, assemelhando-se à figura humanóide, porém com movimentos curtos que evocam uma sensação de estranheza. 

Essa peculiaridade, conhecida como “uncanny valley”, desempenhou um papel significativo no sucesso de FNaF como uma obra de terror. A estranheza de testemunhar criaturas com aparência amigável, que inicialmente cativam as crianças, ao mesmo tempo em que se percebe que há algo terrivelmente errado com elas, contribui para a atmosfera única e aterrorizante do jogo.

4. O filme

Um filme de FNaF foi lançado esse ano, em outubro. Muito aguardado pelos fãs, teve assessoria do próprio criador do game, Scott Cawton.

Talvez seja por isso que alguns detalhes se destacam tanto: o cenário do filme reproduz meticulosamente o do jogo, as mortes são simuladas de maneira tão precisa quanto ocorrem no universo do jogo. 

O filme foi concebido como uma homenagem, dedicando cuidado especial aos pequenos detalhes, como a participação de MatPat, renomado youtuber e um dos representantes originais de FNaF nos primórdios do YouTube.

Ao contrário dos filmes clássicos de terror repletos de jumpscares, este filme reserva espaço para desvendar os acontecimentos. Se você não está familiarizado com a franquia, algumas referências e reviravoltas podem escapar, mas ela não vão falhar em te intrigar e te motivar a pesquisar mais sobre a complexa lore de FNaF. Assim como o jogo, há espaço para interpretações por conta da imaginação de quem vê. 

Agora, se você é um fã ávido do jogo, será uma experiência visualmente deslumbrante ver uma representação viva de Freddy, Bonnie, Chica e Fox. Ao final do filme, te garanto que você vai sentir um carinho peculiar por esses personagens, mesmo que a ideia de encontrá-los na sua cozinha às 3 da manhã possa gerar um misto de medo e fascínio.

VERSÃO EM INGLÊS

Animatronics possessed, the valley of strangeness, and pizza: the lore and success of Five Nights at Freddy’s

An independent horror game released in 2014 that spawned sequels, books, numerous theories, fan forums, and most recently, a film adaptation. Five Nights at Freddy’s is proof of how far a passionate and engaged fanbase can take you.

Summary

1. First, the terminology: what is lore?
2. What made FNaF popular?
3. Well-executed horror and the Uncanny Valley
4. The film

1. First, the terminology: what is lore?

The definition you find on Urban Dictionary (a great source for English expressions and slang) describes lore as “the collective story and sum of all knowledge available about a particular fantasy or science fiction universe.” It’s a concept close to the word “narrative” in plain English, but it’s commonly used when talking about games, movies, and books.
With that as a starting point, the lore of Five Nights at Freddy’s is complex, especially considering there are four editions of the game, each with a distinct story.
The game’s premise revolves around two friends who decide to venture together, opening Freddy’s Pizzeria, a pizza place designed to delight children, similar to the model of major American chains like Chuck E. Cheese.
Initially, the place was a paradise for children, filled with delicious food, recreational activities, music, and the stars of the establishment, the animatronics: Freddy, a bear; Chica, a chicken wearing an apron with the phrase “let’s eat”; Foxy, a fox; and Bonnie, a bunny.

The apparent perfection crumbles when the first death occurs in the narrative, triggering a surprising twist: the spirit of the murdered child becomes trapped inside one of the animatronics.
This idea of spirits linked to the characters and giving them life constitutes the essence of everything that unfolds in FNaF. And this is just the beginning. If you’re interested, rest assured that the rabbit hole of theories and interpretations about the plot and characters goes deep. Here, we’ll give you a brief overview, just to situate you in the context and perhaps pique your curiosity.
Oh, and before we continue, from now on, the name Five Nights At Freddy’s will be referred to by its acronym, FNaF, okay?

2. What made FNaF popular?

The first edition of the game was released in 2014, and its popular success elevated it from an indie game category, small and thrust it into stardom.
One of the reasons for FNaF’s rapid rise was the interest of famous YouTubers who created gameplay videos on their YouTube channels.
Gameplay is essentially the interactive experience of playing a video game. This involves how the game is played, the rules, difficulties, control systems, as well as the narrative, design, aesthetics, and the decision-making process with consequences for the player.
These gameplay videos helped spread the word about FNaF, and, being a horror game, they gained views for providing entertaining, partly comedic content, showing players getting scared. It also allowed people who didn’t want to play the game, due to fear or hesitation, to experience it in a way, just as observers.
The game conquered YouTube and gave rise to a series with numerous sequels, prequels, minigames, and even additional books, creating a lively community of theories about the mythology, fanfics, and many other forms of creative expression.

3. Well-executed horror and the Uncanny Valley

You start playing FNaF, the scenario is this: you are a security guard responsible for the night surveillance of Freddy Fazbear’s Pizzeria, operating from an office equipped with cameras covering the entire establishment, along with two exits. Although the initial setting may seem simple, there’s a vivid contrast with the game’s intricate plot.
Venturing into FNaF research, exploring forums and trying to understand the underlying narrative and events during the game, it becomes evident that the story is incredibly intricate.
However, the game maintains an enigmatic and almost claustrophobic atmosphere, suggesting the thought – and feeling – that something terrible happened in that pizzeria, without clearly explaining in words what transpired in that environment.
In the first game, released in 2014, the peculiarity is intensified by the fact that you cannot establish a dialogue with the animatronics, question them, or seek answers about past events. The only strategy you have in the game is to hide.
This aspect undoubtedly contributed significantly to FNaF’s popularity: the unique ability to build terror in games. The feeling of helplessness, facing the unknown, and trying to survive the night give the game a unique and immersive horror experience.
One element that adds a layer of terror to FNaF is the phenomenon known as the “Uncanny Valley.” Initially associated with robotics and aesthetics, this concept is based on and reflects on the relationship between human and machine.
The term was coined by Japanese robotic engineer and professor Masahiro Mori in his work “Bukimi No Tani Genshō” – literally translated as the “Uncanny Valley Phenomenon.”
The central observation of the book highlights a thin line between human appearance and similarity to a robot. The fundamental idea is that we experience positive emotions when encountering similarities with ourselves, but only up to a certain point.
When the similarity becomes too close, and the distinction between human and non-human becomes much blurrier, these emotions tend to turn negative. Some psychological theories, like the theory of mimetic perception, seek to explain this phenomenon.
Although the reference point for discussing the “Uncanny Valley” is the human figure, there is a gradation that extends to other beings that resemble, to varying degrees, the human form, as is the case with animatronics.
The FNaF universe skillfully uses this concept by presenting animatronics that, while approaching human appearance, still maintain an eeriness that contributes to the game’s unique and terrifying atmosphere.
FNaF characters are bipedal animatronics that move in a peculiar way, resembling humanoid figures but with short movements that evoke a sense of strangeness.
This peculiarity, known as the “Uncanny Valley,” played a significant role in FNaF’s success as a horror work. The oddity of witnessing creatures with a friendly appearance, initially captivating to children, while realizing that there is something terribly wrong with them, contributes to the game’s unique and terrifying atmosphere.

4. The film

A FNaF movie was released this year, in October. Highly anticipated by fans, it had the guidance of the game’s creator, Scott Cawton.
Perhaps that’s why some details stand out so much: the movie’s setting meticulously reproduces that of the game, and the deaths are simulated as precisely as they occur in the game’s universe.
The film was conceived as a tribute, paying special attention to small details, such as the participation of MatPat, a renowned YouTuber and one of the original representatives of FNaF in the early days of YouTube.
Unlike classic horror films full of jumpscares, this film makes room for unraveling events. If you’re not familiar with the franchise, some references and twists might escape you, but they won’t fail to intrigue you and motivate you to research more about FNaF’s complex lore. Like the game, there is room for interpretations based on the viewer’s imagination.
Now, if you’re an avid fan of the game, it will be a visually stunning experience to see a lively representation of Freddy, Bonnie, Chica, and Foxy. By the end of the film, I guarantee you’ll feel a peculiar fondness for these characters, even if the idea of encountering them in your kitchen at 3 in the morning may evoke a mix of fear and fascination.

Escrito por: Renata Bottino, professora de inglês na Idioma Independente em São Carlos – SP

contato: renatabottino.ii@gmail.com

instagram: @renata.bottino